Índice de transparência da Moda Brasil 2020 revela quais marcas e varejistas prestam contas sobre suas práticas socioambientais

Em meio a pandemia e crise climática, sabemos pouco sobre como gigantes da indústria da moda têm amparado seus trabalhadores e preservado o meio ambiente 

O Fashion Revolution Brasil acaba de lançar a terceira edição do Índice de Transparência da Moda Brasil (ITMB), durante o Rio Ethical Fashion, fórum internacional de moda e sustentabilidade. O ITMB 2020 revela em que nível 40 grandes marcas e varejistas do mercado brasileiro estão divulgando publicamente dados sobre suas políticas, práticas e impactos sociais e ambientais ao longo de toda a cadeia de valor. A análise abarca mais de 200 indicadores que cobrem tópicos relacionados a condições de trabalho, trabalho forçado, igualdade de gênero, igualdade racial, emissões de GEE (gases de efeito estufa), descarte de resíduos têxteis, reciclagem e circularidade, entre outros. 

Dentre as empresas pesquisadas, a pontuação média foi de 21%. Nas faixas de pontuação acima de 50%, aparecem C&A (74%), Malwee (68%), Renner (59%), Youcom (59%), Hering (57%), Havaianas (55%) e Osklen (51%). Mas a metade das marcas está concentrada na faixa de 0-10% e, entre elas, 13 zeraram a pontuação: Brooksfield, Carmen Steffens, Cia. Marítima, Colcci, Colombo, Di Santinni, Fórum, Leader, Lojas Avenida, Lojas Pompéia, Moleca, Olympikus e TNG. 

A pandemia prova porque transparência é tão vital 

Com a crise sanitária e econômica desencadeada pelo coronavírus, a indústria têxtil e de confecção tem sido duramente afetada e seus trabalhadores são os mais vulneráveis. A forma como as empresas escolheram gerenciar essa crise mostra muito sobre as estruturas de poder e as verdadeiras intenções que conduzem seus negócios. 

Das 40 marcas analisadas no ITMB 2020, apenas 5 marcas (13%) divulgam suas políticas sobre pagamento de fornecedores, e 3 marcas (8%) publicam o percentual de pagamento dos fornecedores realizados no prazo e de acordo com os termos acordados. Publicar informações sobre suas práticas de compra permite que grandes marcas e varejistas prestem contas pela segurança, saúde e bem-estar dos trabalhadores em suas cadeias. Em momentos como esse, as marcas não podem se esquivar de suas responsabilidades enquanto esperam que seus fornecedores garantam a seus trabalhadores todas as disposições legalmente exigidas, incluindo salários e benefícios integrais. 

A indústria da moda é uma das grandes poluidoras do mundo, mas a maioria das empresas analisadas não divulgam o que fazem para reverter esse cenário 

Grandes empresas da indústria da moda, do Brasil e do mundo, têm um papel importante na aceleração da crise climática e são responsáveis por muitos dos abusos dos direitos humanos que persistem nas cadeias de fornecimento globais. O modelo atual de produção e consumo em grande escala não é benéfico nem para o meio ambiente, nem para o grande número de pessoas que trabalha, muitas vezes, por salários extremamente baixos e

em condições precárias para abastecer as demandas de um mercado veloz. Mas mesmo com a crise iminente, apenas 10 marcas (25%) publicam anualmente a pegada de carbono ou emissões de gases efeito estufa (GEE) de suas próprias instalações, 5 marcas (13%) publicam metas relacionadas à gestão do clima e/ou outros tópicos ambientais com base científica aprovadas pela Science Based Targets Initiative (SBTI) e somente 2 marcas (5%) publicam anualmente a pegada de carbono ou emissões de gases efeito estufa (GEE) de sua cadeia de fornecedores. 

Transparência não é sustentabilidade 

Para o Fashion Revolution, transparência é o início e não um fim, ou seja, é o primeiro passo de uma jornada que leva à responsabilização e prestação de contas que, por sua vez, levam a mudanças na prática. 

“Sabemos que a transparência sozinha não representa o tipo de mudança sistêmica e estrutural que queremos ver dentro da indústria da moda, mas ela ajuda a revelar as estruturas em vigor para que possamos entender como mudá-las.” Eloisa Artuso, diretora educacional do Fashion Revolution Brasil 

Transparência não significa sustentabilidade, mas uma importante ferramenta que joga luz ao longo de todas as etapas da cadeia de valor da indústria da moda – desde a extração da matéria-prima até o descarte. Somente trazendo à tona os desafios e problemas sociais e ambientais presentes nos bastidores da indústria, será possível agir de forma eficaz em prol dos direitos humanos e da natureza. Não há como responsabilizar empresas e governos se não pudermos ver o que realmente está acontecendo. E por isso transparência é tão importante. Baixe o ITMB 2020 e faça parte da revolução da moda! 

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Retalhar encerra ano com narrativas de sucesso socioambiental

Atores econômicos importantes contaram com os serviços da empresa B para iniciar a logística reversa de seus resíduos gerando impacto social positivo

Há sete anos solucionando problemas ambientais com valor compartilhado, a Retalhar encerra 2020 com narrativas de sucesso socioambiental. 

Ao todo, foram 20 toneladas de uniformes profissionais reciclados, que, em vez de serem destinados a aterros sanitários e gerarem gases do efeito estufa, retornaram para a cadeia de produção como matéria-prima valiosa. Atores econômicos importantes como o iFood, Palmeiras e Puma contaram com os serviços da empresa B para iniciar a logística reversa de seus resíduos gerando impacto social positivo.

Os resultados mostram que, apesar do ano desafiador, é possível fazer a diferença por um mundo mais circular e com histórias de impacto, como a de cooperativas de costureiras beneficiadas e da população em situação de rua que foi acolhida por parcerias com empresas, ONGs e sociedade civil.  

Atores importantes do mercado estão aderindo à logística reversa 

Por meio da reciclagem de resíduos de grandes geradores, a empresa B realizou a logística reversa para atores importantes do mercado. Este ano, o iFood foi um deles. A empresa líder latino-americana do setor de entrega de comidas decidiu dar um passo além e reaproveitar mochilas de delivery após o fim de sua vida útil. 

A iniciativa evitou que mais de 20 mil mochilas fossem descartadas incorretamente ou enviadas para aterros sanitários, gerando segunda vida para os resíduos têxteis e renda compartilhada para cooperativas de costureiras. Ao canal do iFood, as costureiras Maria Rosalina e Herculânia Maria relataram como se sentem felizes em trabalhar em prol da sustentabilidade obtendo renda para si próprias com a possibilidade de conciliar a atividade com os deveres familiares. 

Outros atores importantes que colocaram a logística reversa em prática em 2020 foram o Palmeiras e a Puma. Em parceria com a Retalhar, o clube esportivo e a empresa de design atlético entregaram 2 mil cobertores para instituições filantrópicas e pessoas em situação de vulnerabilidade social reutilizando uma tonelada de uniformes.

Menos poluição, mais histórias de impacto

Além de reduzir os impactos ambientais da demanda por aterros e da emissão de gases do efeito estufa, a iniciativa gerou histórias impactantes e acolhimento para pessoas como o camelô Fabiano e seu filho pequeno, que vivem em uma ocupação e foram beneficiados pela ação do time de futebol e da empresa alemã de equipamentos desportivos. 

O Makro, Bradesco, Leroy Merlin Brasil, C&A, Heineken, Nubank

e Ajinomoto também são exemplos da longa lista de empresas que já contaram com os serviços da Retalhar para dar um passo em direção à economia circular. 

Para o CEO da Retalhar, Jonas Lessa, a tendência é que iniciativas semelhantes sejam cada vez mais estimuladas e validadas por grandes empresas, já que, segundo ele:

“No mundo corporativo, muito se fala sobre a importância do colaborador ‘vestir a camisa’ e incorporar os valores da marca, mas ao menor sinal de desgaste, esta camisa é queimada, findando muitas oportunidades sociais e gerando poluição ambiental imediata. A sociedade, que consome e assim sustenta as grandes marcas, não aceitará mais a incoerência entre discurso e prática. É necessário que as empresas vistam a camisa do valor compartilhado.”

Final do ano 2020 é oportunidade para repensar fast-fashion

Em um final de ano atípico, isolamento social pode ajudar a evitar hábitos de consumo nocivos

O isolamento social necessário durante o Natal e Ano-Novo do ano de 2020 torna esses eventos atípicos. Apesar da distância entre as pessoas, o cenário é uma oportunidade para os consumidores desafiarem a indústria têxtil a adotar práticas mais amigáveis ao meio ambiente e abandonar de vez aquelas destrutivas, como o fast-fashion. 

Impactos da pandemia

A pandemia de Covid-19 anunciada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2020 gerou efeitos negativos relevantes, como perda de entes queridos, hospitalizações (e a falta destas), desemprego e desaceleração econômica forçada.  

Ainda sem perspectiva de resolução, pelo menos até o final do ano, o cenário indica que o isolamento social deve ser mantido. Dessa forma, o melhor jeito de viabilizar mais tempo futuro ao lado de quem amamos é evitando as aglomerações comuns dessa época. Porém, pelo lado positivo, esse contexto – em que o contato social é desencorajado – também pode ser uma oportunidade para revisar a cultura do fast-fashion, principalmente em festas de Natal e Ano-Novo. 

Cultura fast-fashion

O que hoje é considerado um hábito cultural, nem sempre foi assim. O fast-fashion surgiu por volta do ano de 1970, quando, ameaçada pela crise do petróleo, a indústria têxtil buscou estratégias para escoar sua produção. A prática do fast-fashion consiste em produzir coleções de peças padronizadas em larga escala, e renovadas em ciclos cada vez mais curtos. Inicialmente, eram duas coleções anuais, conforme as estações nos diferentes hemisférios, mas, atualmente, as marcas já produzem coleções quinzenais. A qualidade inferior desses produtos em relação a peças artesanais barateia a produção, aumentando a chance de escoamento da mercadoria. 

Estima-se que a duração do ciclo de uma peça fast-fashion é de no máximo seis meses, e  emite 400% mais carbono do que peças artesanais e locais. Além disso, há outros problemas envolvidos na produção têxtil em larga escala, como o grande uso de fibras de plástico que se transformam em microplástico com a lavagem, e a reprodução de relações de trabalho escravo ou análogo à escravidão, principalmente em países asiáticos.

Momento de reflexão e mudança para pessoas e empresas

Durante o Natal e o Ano-Novo, é comum que as pessoas encerrem seus ciclos de modo simbólico, desfazendo-se de roupas e comprando novas, por exemplo. Além disso, é um período de troca de presentes, e muitos destes são roupas produzidas dentro do sistema fast-fashion. 

Este ano, porém, o isolamento social gerou algumas mudanças de hábitos. Em relação à moda, um artigo mostrou que os canadenses passaram a usar mais calças moletom, desafiando os varejistas e a indústria têxtil a se adaptarem. Da mesma forma, o Natal e o Ano-Novo em isolamento podem ser uma oportunidade para o consumidor revisar os hábitos criados pelo fast-fashion, como o descarte e consumo de roupas de plástico que serão usadas no máximo 50 vezes. 

Nesse sentido, o poder de mudança de cada um não pode ser subestimado. Um relatório realizado pela parceria entre McKinsey & Company e Global Fashion Agenda avaliou os esforços necessários do setor da moda para combater a poluição ambiental. De acordo com a análise, enquanto a indústria pode reduzir as emissões de CO2 equivalente aumentando a reciclagem de fibras e o uso de energia renovável, o consumidor pode reduzir 21% das emissões de gases de efeito estufa oriundos do setor apenas com mudanças nos hábitos, como evitar o descarte e consumismo, e aderir à reforma, ao reparo e consumo consciente de roupas, alugando, trocando ou comprando peças atemporais e produzidas localmente com materiais menos nocivos, como o algodão orgânico ou reciclado. 

Modelo circular e internet podem ser solução para crise mundial pós-pandemia

Análise de big data, computação em nuvem e Internet das Coisas podem colocar fim ao desperdício e à existência de resíduos

Uma análise realizada por pesquisadores da Universidade de Warwick concluiu que a adoção de estratégias de economia circular seria a melhor maneira do mundo se recuperar da crise econômica global. Aliado à análise de big data, computação em nuvem e Internet das Coisas, esse modelo poderia revolucionar a sociedade e colocar fim ao desperdício e à existência de resíduos. 

Impactos econômicos

Segundo os pesquisadores do estudo “Uma análise crítica dos impactos da Covid-19 na economia global e nos ecossistemas e oportunidades para estratégias de economia circular”, publicado na revista Resources, Conservation and Recycling, a pandemia teve muitos efeitos na vida de todos, desde não sair de casa, ser infectado, hospitalizado, até perder um ente querido ou o emprego. 

Economicamente, o estudo aponta que houve impactos financeiros em níveis macro e microeconômico, incluindo as cadeias de abastecimento globais, o comércio internacional, o turismo, a aviação e o setor têxtil. No entanto, a pesquisa também concluiu que a pandemia provocou algumas mudanças com influências positivas na saúde humana e no planeta. No Reino Unido, por exemplo, mais vidas foram salvas pela redução dos poluentes atmosféricos em comparação com o número de pessoas que morreram com Covid-19 na China. 

A redução do ruído ambiental e do congestionamento de carros levou a um aumento no número de pessoas que se exercitam e aproveitam os espaços ao ar livre. E a diminuição do turismo resultou em menor pressão ambiental nas áreas costeiras. Além disso, o declínio no uso global de energia primária fez a demanda por carvão cair 8%, enquanto o uso de petróleo caiu 60% e a eletricidade 20%, em comparação com o primeiro trimestre de 2019, levando a uma redução recorde das emissões globais de CO₂.

Economia circular como solução para a crise

Um dos pesquisadores do estudo, Dr. Taofeeq Ibn-Mohammed, destacou que, apesar de alguns resultados positivos no contexto da pandemia, o modelo atual de extração e descarte de resíduos no ambiente não é sustentável a longo prazo, pois não reflete melhorias globais nas estruturas econômicas. 

Para o autor, a economia circular precisa ser implementada em todos os setores, com estratégias diferentes para cada um. Além disso, Ibn-Mohammed aponta que é preciso aproveitar o potencial tecnológico dentro da cadeia de suprimentos, aproveitando a análise de big data para agilizar os processos de seleção de fornecedores; a computação em nuvem para facilitar e gerenciar o relacionamento com fornecedores e a Internet das Coisas para aprimorar os processos de logística e remessa.

O autor afirma que são necessários investimentos pós-pandemia para viabilizar economias resilientes, de baixo carbono e circulares, uma vez que o modelo econômico linear dominante é deficiente. Em uma economia circular, não haveria resíduo ou poluição. Em vez disso, todos os subprodutos seriam reutilizados ou reaproveitados, ajudando a acabar com a superexploração dos recursos finitos e os danos ao meio ambiente e à saúde das pessoas.

Para tornar esse processo lucrativo, os fabricantes de itens complexos, como veículos, por exemplo, precisarão usar sistemas de dados avançados baseados na internet, capazes de rastrear componentes e produtos ao longo de seus ciclos de vida, desde a origem até o uso final.  

Reciclagem de poliéster é oportunidade econômica para empresas e catadores

Resíduos têxteis podem voltar para cadeia de produção nas indústrias automobilística e imobiliária e gerar renda compartilhada

A reciclagem do poliéster é controversa, já que o uso desse material gera microplásticos, principalmente durante a lavagem de roupas. Entretanto, há uma oportunidade no mercado que não depende da indústria da moda e que pode reduzir os impactos da produção do material e a geração de microplástico: a absorção do poliéster reciclado pelos setores imobiliário e automobilístico. Além disso, reintroduzir o material na cadeia de produção poderia gerar renda compartilhada, lucro e arrecadação para o setor público.

Material controverso  

Poliéster é uma categoria ampla de polímeros, mas o termo normalmente se refere ao politereftalato de etileno, ou PET. Esse material dá origem a uma diversidade de produtos, que vão de garrafas de plástico a vestimentas. 

Com baixo custo, alta durabilidade e resistência a produtos químicos, radiação e pressão, o poliéster representa 52% das fibras têxteis do mundo, e faz parte da composição de tintas, pneus, isolantes, instrumentos, entre outros artigos. 

Por outro lado, também há desvantagens. É um material de origem não renovável e, em sua produção, há impactos socioambientais da instalação de usinas petrolíferas, além de gasto de energia e emissão de compostos orgânicos voláteis (VOCs) e efluentes. Já no consumo e pós-consumo, são gerados micro e nanoplásticos, principalmente durante a lavagem das roupas, que é responsável por gerar 35% dos microplásticos encontrados nos oceanos. 

Apesar de sua propriedade de poder ser submetido à reciclagem (o que evitaria os impactos associados à extração de petróleo), este não é o destino mais frequente do poliéster, uma vez que apenas 14% do PET presente no mercado mundial é reciclado. E a produção diária continua crescendo nas usinas de petróleo diariamente. 

Papel dos catadores na reciclagem do poliéster

No Brasil, os catadores são atores importantes na reciclagem de materiais como o alumínio. Entretanto, devido a políticas públicas ineficientes e desarticulação do setor, isso não se aplica ao poliéster. 

Em participação no webinar da 4ª edição da Brasil Eco Fashion Week (BEFW) – mediado pelo CEO da Retalhar, Jonas Lessa –  a coordenadora de projetos do aplicativo Cataki, Juliana Fullmann, aponta que a própria lei é um empecilho para a catação de PET. Segundo ela, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) tem suas limitações, já que não inclui o catador autônomo dentro das definições do que é ser um catador de material reciclável. 

Isso faz com que o catador autônomo, importante agente ambiental especialmente nos grandes centros urbanos, não consiga fazer boas negociações – principalmente com garrafas PET, que fazem muito volume e pouco peso – o que acaba inviabilizando o retorno financeiro do poliéster para a categoria e, consequentemente, sua catação. 

Oportunidade para todos

O Brasil é um grande consumidor de poliéster, porém, a reciclagem desse material no País não é significativa. Todos os dias são descartados retalhos em bom estado nas ruas de grandes centros. Esses descartes podem vir a fazer parte da catação e gerar renda, uma vez que, diferente das garrafas PET, têm peso significativo com pouco volume. 

A reciclagem de poliéster é uma oportunidade de geração de renda para os catadores e outros grupos envolvidos nesse processo. Além disso, retornar o material para a cadeia produtiva com logística reversa evitaria os impactos da produção (que continua ativa) e também poderia gerar arrecadação para o setor público e lucro para empresários, sem depender da indústria da moda.

Amazônia, crescimento econômico e benefícios socioambientais podem andar juntos

Crescimento econômico não precisa se dar às custas da destruição do bioma amazônico. Desenvolvimento e conservação podem estar lado a lado.

A Amazônia brasileira tem sido alvo de intenso debate nos últimos meses. Por conta de queimadas e desmatamento intencionais, a perda de biodiversidade e serviços ecossistêmicos é crescente. 

Politicamente, há quem defenda que destruir o bioma é o preço que se paga pelo desenvolvimento. Mas, o que pouco se fala, é que o crescimento da economia e do desmatamento, seja este por corte ou queimada, são inversamente proporcionais. Em outras palavras, isso significa que quanto maior é a taxa de destruição da natureza, menores são os benefícios materiais. E isso é comprovado historicamente.  

Causas e consequências

Impunidade a crimes ambientais, retrocessos políticos, grilagem e atividade agropecuária estão entre as principais motivações das queimadas e do desmatamento da Amazônia. É o que aponta um extenso relatório realizado por um grupo de trabalho conjunto de ONGs e institutos importantes como Greenpeace, WWF e Instituto Socioambiental. 

Além da perda de biodiversidade, a análise mostra que essas práticas aumentam os casos de doenças respiratórias, alteram o clima regional, colocam em risco a produtividade no campo, aumentam o risco de boicote internacional e ainda contribuem com o aumento da emissão de gases do efeito estufa, cuja emissão tem efeito negativo comprovado em estudos sobre o Custo Social do Carbono. Nada disso é convertido em riqueza ou benefícios para a população local e nacional. 

Os municípios da Amazônia estão entre os de menor IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e IPS (Índice de Progresso Social) do País. As cidades são inchadas, com infraestrutura deficiente, sem empregos de qualidade e com concentração de renda. 

Durante o longo período de 2007 a 2016, todo o desmatamento da região representou somente 0,013% do PIB médio do País. Por outro lado, quando foram adotadas medidas de bloqueio ao desmatamento com a chamada Moratória da Soja, a produtividade local aumentou, pois as áreas já desmatadas e mal utilizadas foram melhor aproveitadas. 

Oportunidades econômicas com benefícios socioambientais

Dados históricos mostram que é possível conciliar conservação ambiental e crescimento econômico. Além da implementação de políticas públicas ambientais efetivas e perenes, como a já mencionada Moratória da Soja, o engajamento de consumidores, empresários e investidores pode fazer a diferença nos esforços de combate ao desmatamento.

Monitorar cadeias de produção que estão ligadas à Amazônia – incluindo os fornecedores indiretos -, intensificar o comprometimento com pautas ambientais e comunicar publicamente os resultados de auditorias são boas práticas empresariais. 

Consumidores e sociedade, por outro lado, podem exigir políticas públicas eficientes e apoiar a produção sustentável, incentivando empresas que incorporam boas práticas socioambientais. Nesse sentido, há boas oportunidades. Um relatório da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), de 2020, mostrou que quase dois terços dos brasileiros estão dispostos a pagar mais caro por “produtos sustentáveis” e que 88% se preocupa com o nível de preservação da floresta amazônica. 

Retalhar mobiliza sociedade civil e outras 20 empresas para combater frio nas ruas

Iniciativa produziu e distribuiu mais de 11 mil cobertores para pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade.

A Retalhar, a população e outras 20 empresas formaram parceria para promover impacto socioambiental positivo em tempos de frio. Além de gerar renda inclusiva para trabalhadores em estado de vulnerabilidade, a ação reaproveitou mais de 14 toneladas de uniformes profissionais, produzindo 11.520 cobertores para pessoas que vivem em situação de rua. 

A Nespresso, SPMar, AB Concessões, Bradesco, Sociedade Esportiva Palmeiras, Ajinomoto, Bodytech, Duquima, Ulma Packaging, Johann Alimentos, SEW, Makro Atacadista, Transjordano, Leroy Merlin, Arcelor Mittal, Wilson Sons, Epiroc, Leccor, Unimed Campinas e Cleanic Ambiental toparam o desafio de fazer a diferença e se uniram à Campanha de Inverno da Retalhar, enquanto pessoas da sociedade civil se engajaram na Campanha Existe Calor em SP, que foi realizada em parceria com o Instituto Ninho Social e com apoio da Cotton Move e Souza & Cambos.

Pessoas e empresas aderiram à Campanha Existe Calor em SP

A iniciativa teve duas frentes importantes. Uma delas contou com a participação de pessoas físicas, que puderam realizar suas doações a partir de R$20,00 por meio da plataforma do Projeto Atalho. A iniciativa levou proteção e acolhimento para pessoas em situação de rua, por meio da distribuição de 478 cobertores feitos a partir da recuperação de resíduos têxteis e 744 máscaras distribuídos para pessoas em situação de rua em São Paulo, itens estes distribuídos pelo Instituto Ninho Social.

A outra partiu de empresas que se engajaram na causa, destinando seus uniformes para a Retalhar reciclar e transformá-los em cobertores populares.

Impacto socioambiental positivo

Além de causar impacto social positivo por meio do combate ao frio nas ruas da cidade de São Paulo e da geração de R$39.899,78  para trabalhadores em situação de vulnerabilidade, a ação resultou em bons frutos para o meio ambiente. 

Mais de quatorze toneladas de uniformes deixaram de ser enviadas para aterros sanitários, evitando que fossem geradas 218,56 toneladas de CO2 equivalente. Para compensar essas emissões de outra forma seria necessário plantar mais de 1.500 árvores.  No final das contas, o volume de aterro poupado (111,36 m³) foi o equivalente a 30 carros populares. 

Como a indústria da moda pode agir para reduzir os GEEs?

Um relatório publicado pela consultoria empresarial americana McKinsey & Company e pela Global Fashion Agenda avaliou os esforços necessários do setor têxtil no combate às mudanças climáticas. Após analisar a cadeia de valor de fazendas e fábricas; marcas e varejistas; formuladores de políticas; investidores e consumidores, a avaliação concluiu que todos os participantes em todas as partes da cadeia têm papel importante na descarbonização. 

Poluição relevante

O setor de têxtil e moda, segundo o relatório, foi responsável por emitir cerca de 2,1 bilhões de toneladas métricas de gases de efeito estufa (GEEs) em 2018, o que equivale a cerca de 4% do total global de emissões. Em outras palavras, isso significa que a indústria da moda emite aproximadamente a mesma quantidade de GEEs por ano que todas as economias da França, Alemanha e Reino Unido juntas.

Tendência de aumento das emissões

Apesar dos esforços para reduzir as emissões, é preciso evitar o aumento de 1,5 grau Celsius para mitigar as mudanças climáticas, segundo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) ratificado no Acordo de Paris de 2015. Para chegar a esse nível, o setor precisaria cortar suas emissões de GEE para 1,1 bilhão de toneladas métricas de CO2 equivalente até 2030. Mas os cálculos de projeção, ajustados para levar em conta os impactos da pandemia de Covid-19, mostram que a indústria tende a ultrapassar quase o dobro da sua meta, com emissões de 2,1 bilhões de toneladas métricas de  CO2 equivalente em 2030, a menos que adote ações relevantes de mitigação. 

Desafios

Um dos desafios que o setor têxtil enfrenta é o aumento nos padrões de consumo, o que pode elevar as emissões de carbono para cerca de 2,7 bilhões de toneladas métricas por ano até 2030. Caso a indústria continue a adotar iniciativas de descarbonização em seu ritmo atual, será possível limitar as emissões em cerca de 2,1 bilhões de toneladas métricas por ano até 2030. Ainda assim, mesmo com esses esforços, as emissões atingiriam quase o dobro do nível máximo necessário para evitar o aumento na temperatura global em 1,5°C. 

Seria preciso intensificar as ações de redução de emissão e aumentar os esforços de descarbonização para reduzir as emissões anuais para 1,1 bilhão de toneladas métricas em 2030. Cerca de 60% da redução de emissão adicional sob este cenário de redução acelerada poderia ser alcançada por meio de iniciativas como melhorias de eficiência energética e uma transição para energia renovável, com o apoio de marcas e varejistas. Outros 18% das emissões poderiam ser economizados por meio de melhorias operacionais por marcas de moda, e outros 21% por meio de mudanças no comportamento do consumidor. Juntos, esses esforços podem remodelar o cenário da moda.

A boa notícia para a indústria têxtil é que muitas das ações necessárias para a redução das emissões podem ser realizadas a um custo modesto. Quase 90% das medidas custariam menos de 50 dólares por tonelada métrica de emissões de GEE reduzidas. 

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Dado o potencial para atuar como os principais impulsionadores da redução de emissões, as marcas e os varejistas possuem um chamado para colaborar com outras partes da cadeia de valor para investir em benefícios sociais e ambientais de longo prazo. É necessário apoiar os esforços de descarbonização em outras partes do setor e ajudar os consumidores a fazerem escolhas de compra mais sustentáveis.

Ações necessárias

Os fabricantes e produtores de fibra podem reduzir 61% das emissões descarbonizando a produção, fabricação de roupas e processamento de materiais, além de minimizar os resíduos da produção e fabricação. Melhorias na eficiência energética e uma transição do uso de combustíveis fósseis para fontes de energia renovável podem gerar cerca de 1 bilhão de toneladas métricas de redução de emissões em 2030 em toda a cadeia de valor da moda.

As principais contribuições que as marcas podem fazer para a redução de emissões são:

  • Melhorar a mistura de materiais (aumentando uso de fibra reciclada, por exemplo);
  • Aumentar o uso de transporte sustentável;
  • Melhorar as embalagens (com materiais reciclados e mais leves);
  • Descarbonizar as operações de varejo;
  • Minimizar os retornos e reduzir a superprodução. 

Se as marcas seguirem estas medidas, elas poderão atingir 308 milhões de toneladas métricas de redução de CO2 equivalente em 2030.

A adoção de uma abordagem mais consciente no comportamento do consumidor durante o uso, reutilização e escolha por marcas de modelos de negócios sustentáveis podem contribuir com 347 milhões de toneladas de redução de emissões em 2030. A principal alavanca neste esforço é o aumento no número de modelos de negócios circulares, que promovam:

  • Aluguel;
  • Revenda;
  • Reparo e reforma de roupas;
  • Redução na lavagem e secagem; 
  • Aumento na reciclagem e coleta (para reduzir os resíduos enviados a aterros).

Os formuladores de políticas e investidores também têm papéis importantes a desempenhar nesse sentido. Governos e reguladores devem promover práticas sustentáveis ​​e consumo consciente, além de fornecer incentivos para apoiar medidas de descarbonização com alto potencial de redução. Os investidores podem dar sua contribuição incentivando iniciativas de descarbonização, transparência de emissões e inovação com foco na sustentabilidade entre as empresas de seus portfólios.

Compromisso

Acelerar a redução de emissões por meio das ações mencionadas exige compromissos ousados ​​das partes interessadas em toda a cadeia de valor. Esses compromissos precisam ser apoiados por ações igualmente ousadas, maior transparência, maior colaboração e investimento conjunto.

Texto adaptado de relatório realizado pela parceria entre McKinsey & Company e Global Fashion Agenda

Economia circular funciona em qualquer tipo de empresa e beneficia toda sociedade

Incorporar práticas de circularidade é produtivo para empresas e pessoas, principalmente se a iniciativa partir de grandes players do mercado

A incorporação da economia circular pelos mais diversos negócios é uma alternativa viável para empresas, governos e sociedade. Além de possibilitar a conservação dos recursos naturais, sua prática pode melhorar os processos produtivos e proporcionar benefícios socioambientais. 

Economia circular

A economia circular é um conceito baseado na ideia de ciclos. O modelo de circularidade parte do princípio que o sistema industrial deve ser regenerativo. Empresas que procuram  se adequar a esse formato substituem a ideia de “final de vida do produto” pelo conceito de restauração e menor geração de impacto socioambiental.

O modelo econômico circular pode ser implementado em todos os setores produtivos e a nível global. As empresas que a ele aderem podem inserir em seus processos design regenerativo, cradle to cradle (do berço ao berço), ecologia industrial, economia de performance, blue economy, biomimética, entre outros conceitos. A ideia principal é ir além dos limites da economia linear

Modelo linear 

No modelo linear vigente, a organização da sociedade é baseada na extração crescente de recursos naturais. E os produtos feitos a partir desses recursos são utilizados até serem descartados como resíduos. Nessa forma de economia, a maximização do valor dos produtos se dá pela maior quantidade de extração e produção. 

O resultado é o aumento da poluição em suas diversas formas, esgotamento dos recursos naturais, degradação ambiental e mal-estar social. Os resíduos tratados como descarte, por exemplo, podem ser prejudiciais para empresas, pessoas e ambiente. Eles podem vir a demandar mais espaço em aterros, impedindo o uso do local para fins mais nobres; deixam de ser novas matérias-primas que poderiam ser reutilizadas pela empresa e, em decomposição, podem liberar gases que contribuem para a poluição do ar, um problema que agrava as mudanças climáticas e já mata milhares de pessoas por ano no mundo, segundo estudo realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Papel dos grandes players

Na prática, os negócios podem começar a se alinhar aos princípios da economia circular ao incluir o uso de energia renovável, substituir produtos químicos nocivos por alternativas mais limpas e eliminar ou reduzir a geração de resíduos por meio de melhorias no desenho industrial e nos negócios; contratando, por exemplo, serviços prestados por empresas recicladoras. Grandes players do mercado têm um potencial de colaborar com  a economia circular de modo significativo; não só pela escala com que produzem e repetem processos, mas também pela sua influência no mercado, que incentiva outras empresas a adotarem práticas semelhantes.

Parceria entre Palmeiras, Puma e Retalhar é exemplo de responsabilidade socioambiental

Juntos, clube e empresas reciclam uma tonelada de uniformes de funcionários e atletas para doar 2 mil cobertores a abrigos e pessoas em situação de vulnerabilidade social

O Palmeiras e a Puma entregaram 2 mil cobertores para instituições filantrópicas e pessoas em situação de vulnerabilidade social durante o inverno do mês de agosto. O material foi confeccionado pela Retalhar, que utilizou como matéria-prima uma tonelada de uniformes usados pelo clube. 

Reciclagem

Todos os anos, os clubes de futebol realizam mudanças nos modelos de seus uniformes. Mudanças de patrocínio e saída de funcionários são alguns dos motivos pelos quais milhares de peças em bom estado sejam enviadas a aterros sanitários todos os anos. Porém, esse ano, como parte do programa de responsabilidade institucional Por um Futuro Mais Verde, o Palmeiras resolveu dar um melhor destino aos seus uniformes. 

Tudo começou com uma parceria com a Retalhar, empresa B certificada que resolve problemas sociais e ambientais por meio da logística reversa de uniformes profissionais e resíduos têxteis. O processo consiste, basicamente, em retirar as partes metálicas e não recicláveis de cada peça. Em seguida, os uniformes entram em uma máquina para serem triturados até virarem um emaranhado de fibras. 

Em uma outra fábrica, essas fibras passam por uma etapa de aglutinação e então são transformadas em cobertores. Nesse processo, uma tonelada de resíduos, incluindo uniformes usados e retalhos desperdiçados na fabricação foram reciclados e deixaram de ser enviados a aterros para dar forma a 2 mil cobertores que foram doados a instituições filantrópicas e pessoas em situação de vulnerabilidade social.

Impacto socioambiental

Os cobertores foram doados para abrigos, asilos e pessoas que estão em situação de vulnerabilidade social nas ruas de São Paulo, enfrentando o inverno da cidade. O atacante palmeirense Luiz Adriano entregou alguns deles pessoalmente em nome do clube. E um dos beneficiados foi Fabiano, que é pai solteiro, camelô e mora em uma ocupação com seu filho pequeno.  

O Frei Augusto, que é Coordenador da Ordem São João de Deus, instituição beneficiada pela ação, expressou seu agradecimento: “nesses tempos de Covid as dificuldades aumentam e os cobertores do Palmeiras chegaram em boa hora. Nossa gratidão nos faz sentir recompensados por esse ato de generosidade”. 

A parceria entre o Palmeiras, a Puma e a empresa Retalhar é um exemplo de responsabilidade social que precisa ser seguido por outros clubes e empresas com grandes volumes de uniformes, já que, segundo o CEO da Retalhar, Jonas Lessa,  “o Brasil não é um país que recicla nem os resíduos convencionais de coleta seletiva, quem dirá resíduos têxteis. Se você olhar os relatórios não se menciona o têxtil. Como se não fosse um resíduo que estivesse na casa de todos nós”.